sexta-feira, 20 de julho de 2012

A rainha do technicolor

Maureen O'Hara
por
Manuel Cintra Ferreira

Coisas boas em jornais


Maureen O'Hara. Foto sem data encontrada em www.tumblr.com.

Segundo Howard Hawks, inspirando-se em Anita Loos, Os Homens Preferem as Loiras. Passava-se isto em 1953 e a loira era mesmo uma inspiração, Marilyn Monroe. Dois anos depois, Richard Sale, pondo a tónica em Jane Russell, acrescentava, também segundo a mesma escritora que, sim senhor, é verdade, mas... de facto... os Gentlemen Marry Brunettes, que a distribuição portuguesa, sem fazer a ligação (e tirar a «moral» de Loos) e querendo aproveitar-se do sucesso do filme anterior, baptizou, muito prosaicamente de Os Homens Preferem as Morenas. Aí estavam, portanto, nos títulos originais, as «casadoiras» e as «outras» (as tais «loiras»). Então, e as ruivas? Pois, as ruivas! Da fama de perigosas e ariscas não se livravam.
   Em termos cinéfilos, a fama tinha a sua razão de ser nalgumas ruivas que perturbavam a libido masculina nas salas escuras, destacando-se uma, de pêlo na venta, mangas arregaçadas e pronta para uma boa luta em pé de igualdade com qualquer macho: Maureen O’Hara. E geralmente esse macho era nem mais nem menos do que John Wayne. O par andou a medir forças ao longo de três filmes sob a batuta de mestre John Ford (Rio Grande, O Homem Tranquilo e A Águia Voa ao Sol), e mais dois de um mau discípulo, Andrew V. McLaglen (McLintock, que até é o melhor que o filho de Victor McLaglen realizou, e um breve encontro do par já «maduro» em Eu Julgava-o Morto Mr Jake!), com altos e baixos, passou pela separação e reconciliação em Rio Grande, onde os Sons of the Pionneers lhe fazem uma das mais belas serenatas que se ouviram na tela com a canção popular «Kathleen» (Oh Kathleen, My Kathleen!), e enfrentou-se no maior «corpo-a-corpo» da história do cinema, em OHomem Tranquilo («homérico!», como diria Barry Fitzgerald no filme, e quem o viu sabe ao que ele se refere), uma daquelas histórias que nos põem em estado de euforia, e que nos mostra o mais belo beijo cinematográfico que o próprio «Extra-Terrestre» (no filme de Spielberg) não resistiu a imitar. John Ford dirigiu a sua actriz favorita em mais dois filmes, dando-lhe galãs mais maleáveis e destinados à faceta «maternal» que as suas «fúrias» escondiam: Walter Pidgeon em O Vale Era Verde e Tyrone Power em Uma Vida Inteira.


Maureen O'Hara. Foto sem data encontrada em farm2.staticflickr.com.

Pois foi Maureen O’Hara a minha primeira paixão infanto-juvenil. Na altura eu estava naturalmente a leste das implicações do que atrás referi. Mais do que qualquer manifestação edipiana ou reflexo para a passividade, talvez se tenha tratado de um mero acaso: foi a primeira que se me fixou na retina e nas meninges, e logo num filme que salientava já aquelas características: O Terror dos Sete Mares. Feliz acaso, proporcionado por um costume dos velhos cinemas de bairro de Lisboa: o de por vezes exibirem em complemento (eram os tempos das sessões duplas), filmes «a pedido de várias famílias». O filme de Frank Borzage, já velhinho naquele tempo, e em cópia que deixava a desejar lá surgiu em complemento do filme que me levava ao cinema: A Gata Borralheira de Disney. O Terror dos Sete Mares fez-me nascer duas paixões: a referida ruiva e os filmes de piratas. Só mais tarde percebi que, afinal, as duas estavam ligadas. Pois os «sete mares» eram um segundo «habitat» para Maureen O’Hara, que já andara pelas mesmas andanças no magnífico O Pirata Negro e seria uma perfeita rainha de piratas em No Reino dos Corsários, enfrentando, de espada na mão, o campeão masculino Errol Flynn. Nestas andanças, de espada (Os Filhos dos 3 Mosqueteiros) ou pistola (No País dos Comanches, A Última Avançada) na mão, pelas planícies do Oeste, sobre o mar, ou envolvida nos véus transparentes das fantasias orientais (Sinbad, o Marinheiro, Bagdad, Chama da Arábia), surgia-nos pintada com a paleta mágica do Technicolor, num tempo em que cor rimava com esplendor, fazendo parte de um friso que ficou conhecido como as «rainhas do Technicolor», formado por ela, Yvonne De Carlo, Maria Montez, Virgínia Mayo, e outras. Mas rainha, rainha mesmo, só uma: Maureen O’Hara.
   E é assim que a recordo.

Manuel Cintra Ferreira em Expresso, 15 de Julho de 2006



Maureen O'Hara em Lady Godiva (1955) de Arthur Lubin. 
Foto encontrada em fx.worth1000.com.




 Maureen O'Hara, em cinco filmes de John Ford.


Maureen O'Hara, também fez este filme de Ray Milland (1956) e muitos mais claro.


(Cartazes dos filmes encontrados na net)



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